segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Eleições 2014- opopular

Consolidar financiamento é prioridade no setor cultural

Programas de fomento e de incentivo sofrem com atrasos de pagamento e desgastam relação entre setor público e artistas
Bruno Félix21 de setembro de 2014 (domingo)

Consolidar financeiramente os programas de fomentos é um dos grandes desafios do próximo governador de Goiás no setor cultural. O tema foi a principal discussão do setor neste ano após o atraso no cumprimento do cronograma de pagamento do Fundo Estadual de Cultura.
O montante de cerca de R$ 13,2 milhões, referente ao exercício fiscal de 2013, que deveria ser pago em parcela única até o fim do primeiro semestre de 2014, conforme previa o edital, não foi viabilizado por falta de caixa. Depois de muitas manifestações da categoria, foi selado acordo de parcelamento em três vezes. Para 2015, o valor previsto é de cerca de R$ 34 milhões.
Essa rusga nos atrasos de repasses do Fundo também foi responsável, segundo informações de bastidores, pela queda do ex-secretário Gilvane Felipe, no final de julho, após expor o embate interno na administração estadual entre as pastas da Cultura e da Fazenda, por causa da polêmica de liberação de caixa para a execução dos prazos estabelecidos. Porém, em nota, o governo afirmou que a saída dele do cargo foi para a participação na campanha de reeleição de Marconi Perillo (PSDB). O posto é ocupado hoje pelo artista plástico Aguinaldo Coelho.
Para o presidente do Conselho Estadual de Cultura, Carlos Cipriano, é fundamental para a esfera cultural o cumprimento rigoroso dos editais para evitar prejuízos na produção artística. Segundo ele, o fortalecimento e a manutenção dos incentivos representariam grande avanço no setor. “Nossa luta é para que esses mecanismos funcionem da forma como está previsto na lei porque até agora tudo que foi conquistado foi na base da paulada. É preciso segurança para trabalhar porque vejo como uma tremenda ignorância a falta de políticas culturais”, afirma.
A novela no pagamento dos projetos aprovados, 270 no total, também gerou cancelamentos. O Paralelo 16 – Mostra de Dança Contemporânea foi um dos mais atingidos pelo atraso. Em sua 6ª edição, o festival teve que reduzir sua programação de 12 dias para cinco, com diversas companhias de teatro de todo o Brasil e oficinas de dança. “Aconteceram várias mudanças no cronograma de depósito sem nenhuma justificativa na época. Assim, fomos forçados a realizar somente a primeira semana do evento”, lembra Vera Bicalho, diretora-geral do Paralelo 16.
Segundo o produtor cultural Marcelo Carneiro, receber o acordado no período definido se tornou um exercício de paciência para a categoria ano a ano. Ele afirma que a situação é desgastante. “É necessário discutir caminhos melhores, que façam com que esses incentivos se interiorizem de fato. Não podemos ter receios sobre os programas de fomento. Enfim, que o governo ajude a botar esperança e entusiasmo dentro da alma de cada artista, e não tirar o pouco já conquistado porque isso vai gerar resultado positivo para a comunidade”, considera.
Para Fabrício Nobre, ex-superintendente de Ação Cultural da Secretaria Estadual de Cultura e produtor de festivais na capital, como Bananada e Goiânia Noise, é preciso que o governo demonstre de fato que as leis de incentivos não serão negligenciadas e que os eventos terão os valores assegurados conforme o edital. Segundo ele, o setor em Goiás melhorou na última década, mas ainda está longe do ideal. “É preciso encarar a cultura como assunto prioritário e tratar como ação transformadora da sociedade”, avalia.
O secretário de Cultura, Aguinaldo Coelho, concorda com a posição dos produtores e fala em melhorias que estão sendo discutidas durante reuniões em prol dos mecanismos de fomento. “Os editais futuros serão mais simples. Outra medida seria o pagamento na data correta, isso é a principal meta. Depois, facilitar a prestação de contas para que se possa desenvolver os esforços para a qualidade do projeto. Ninguém nasce pronto, é um aprendizado, é normal evoluir, tem que ter sensibilidade e não se acomodar, achando que está tudo perfeito”, justifica.
Criado em março de 2006, pela Lei nº 15.633, que ficou guardada na gaveta por mais de seis anos e resgatada em maio de 2013, o Fundo foi vinculado à extinta Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico Teixeira (Agepel), atual Secult Goiás. O programa estabelece que o Estado deve investir 0,5% de sua receita tributária líquida em pesquisa, criação e circulação de obras de arte e realização de atividades artísticas e culturais. “Aconteceu o atraso nos repasses esse ano, mas fizemos uma planilha para não prejudicar ninguém”, lembra Aguinaldo Coelho.
SITUAÇÃO IDÊNTICA
A mesma situação de atrasos nos pagamentos é recorrente também com o Programa Estadual de Incentivo à Cultura, a Lei Goyazes, um dos pilares da política cultural no Estado, pela outorga de crédito de ICMS. Criado no ano 2000, ainda na primeira gestão do governador Marconi Perillo (PSDB), o incentivo, que sempre teve histórico problemático, nunca deixou de ser alvo de críticas, no princípio pelos baixos valores que então disponibilizava, depois pela falta de transparência do processo de seleção dos beneficiados e pelos cortes no valor.
Como, por exemplo, em 2010, no governo de Alcides Rodrigues, a previsão de pagamento era de R$ 5 milhões. A gestão na época decidiu que no exercício daquele ano o montante sofreria corte de 50%. A medida deixou vários projetos aprovados inviabilizados. A justificativa da Secretária da Fazenda (Sefaz) na ocasião foi a situação financeira precária do Estado. Em 2012, o valor retornou ao teto e foi anunciado que seria dobrado (R$ 10 milhões) em 2013, quando também sofreu com problemas de atrasos nos repasses e teve reajuste de 40%.